Refletor.



Confesso que hoje não há lugar em mim que já não queira um bom pecado. De certa forma eu acostumei a viver entre o mel e o fel e acho que isso seja bom. Até parece que perdi a noção do que é bom e do que me fere. E agora já não sei se sinto tudo ou se estou tão insensível como antes. É brincar com sagrado e profano. Não falo de um mal remediável, falo de algo que não tem mais solução. Como outrora diria: "ele pôs um feitiço em mim". Agora os dias correm, as noites se prolongam e tudo o que passa pela minha cabeça é a vontade de beber mais dessa garrafa.


O que se encontra aqui é um desejo incontrolável. Não é algo que eu possa desfazer ou simplesmente contornar. Não dá pra enganar e não tem como desfazer. É algo que é guardado e inconfortável. É como preferir andar sobre espinhos. Tanto dó quanto aquece, e baby, eu amo esse calor.
Não há muito o que se dizer. Não há nada na Terra que explique essa minha paixão por querer dar mais do que tenho e ainda assim, me prender de todas as formas. Talvez, por que essa solidez que rege você me guia também, talvez por que eu tenha me apaixonado por teus erros, talvez por que de fato, somos só isso mesmo e nada além.
Então, vou deixando por um triz, o impossível necessário, por medo de não me acostumar com algo diferente. Vou pecando com os mesmos pecados. Me trancando com as mesmas chaves, esperando se você vai ver os tic-tacs do relógio soarem o código para me abrir. E às vezes proponho pra mim mesma"façamos diferente do passado" mesmo me vendo presa à algo que construirmos. Como uma bola e uma corrente que  pos se a mim em algo nunca imaginado. E nessa prisão eu me faço feliz. É pele sobre a pele pela tarde...

Um sonho de uma noite de verão

Naquela noite não houve festa, ela não havia bebido, mas seus olhos borrados de preto denunciavam que algo tinha acontecido. Ela entrou na sala cambaleando só, mas falava muito com alguém que nunca apareceu.
Não estava linda, mas estava com algo que certamente me chamou atenção. Pulse estava estampado em seu corpo, como outrora fora dito, de curvas sutis. Deitou-se no sofá azul e ficou olhando fixamente para o teto cinza. Se eu pudesse ter tocado ela, aposto que estava frio, pois sua perna estava arrepiada, e arrepiava toda vez que ela sorria. Sua boca pálida evidenciava sua exaustão, sua sede.
Eu a observava como quem observa uma tela, procurando detalhes onde não existem. Eu a sentia totalmente desassociada de minh’alma e intimamente ligada a ela. Sabe quando a tristeza se torna bela? É exatamente o que pensei quando vi.
Sorrateiramente o cinza do teto começou a se escurecer. Parecia que todo o Atlântico tinha caído sobre ela. Nunca houve chuva como aquela. Da janela cozinha a Lua se espremia entre uma nuvem e outra e conseguia iluminar o rosto vermelho dela com uma luz azulada. Os raios gritavam alto e iluminavam a cidade que tinha dado blackout. Cada um deles como um desenho de Frank Miller. A casa estava escura. Apenas um feixe de luz saindo da janela da cozinha.
Calmamente, ouve-se a porta correr em seus trilhos. Ele está ensopado. A água molha seu rosto e a luz da cozinha transforma cada gota em um prisma. De longe, ele está se derretendo em cores. Ofegante. Ele fica parado na porta enquanto escoa todas as cores que ele tem pelo chão.
Ela levanta apressadamente do sofá e para poucos centímetros dele. Olha em seus olhos que também estão borrados, como nos fins de noites. Ele sorri tristemente para ela. Ela começa então a tirar silenciosamente e serenamente sua roupa. Relógio, colete, camisa, calça, samba-canção. Ele fica ainda com os coturnos, arrepiado por completo. Ele está deixando-a molhada aos poucos.
Eu queria ter mãos de Zakuro pra pintar aquela cena, pois certamente, é uma das coisas mais lindas que já vi. Ele escoando sua alma em cores, ela o secando com cabelos como se fosse a própria Maria Madalena secando os pés de Jesus.
Ele então, brutalmente crava as unhas em sua cintura, levanta ela e joga seu corpo sobre o sofá azul. Abre suas pernas como quem rasga um lençol velho. Se encaixa perfeitamente entre elas. Os olhos amendoados dela estão redondos, estáticos e assustados. Ele está louco e perturbado. Passa a mão no rosto. Arranha as suas pernas. Encara a moça. Então, deita sobre Pulse com olhos úmidos e esbraveja como um bárbaro: Nunca Mais.

Fale mal de mim


E que falem, gritem, apontem.
Eu nasci pra isso!
O alvo dos dedos caluniadores e do dedo podre deles.
Nasci para a raiva, o ódio, o rancor.
Para a lascividade, a arrogância, para a luxúria!
Não tiveram sucesso os que tentaram e teimarem em querer me colocar em uma fórmula de boa conduta. "Devoradora de homens" e "sugadora de mulheres".
A louca, a tormenta, o terror dos casamentos, o crack do século, a doença da década.
Falem, gritem! Aumentem meu cartaz!
 Que eu seja assunto das aflitas conversas das mulheres deixadas pelos maridos que deixei,
seja o assunto das mães que vêem seus filhos beirando a insanidade.
Vou mergulhar no fogo do inferno e vou voltar montada
nos mais terríveis demônios que a Terra ainda não teme.
E assim, quando o caos e o kaos forem instaurados nas suas casas,
lembrem de meu nome, lembrem de minhas palavras!
Atrás de meu nome virão multidões com suas foices
E tochas  sedentas pelo meu sangue
Já não temo as más línguas.
Já não temo as mentes enferrujadas e secas.
Que o mundo me abrace.